quarta-feira, 24 de abril de 2013

Construção, Obra e direito autoral

A palavra obra lembra construtores, engenheiros, arquitetos, operários e imobiliárias. Essas são as funções e profissões ligadas diretamente ao mercado da construção civil e, que movimentam o badalado mercado imobiliário tanto na esfera pública quanto na esfera privada. A centralidade da palavra obra na dinâmica da vida prática da sociedade, é algo impressionante. Uma obra literária pode ser consequência de uma obra, no sentido de construção de uma casa, de um barraco ou de um abrigo qualquer, que vá resolver, ainda que parcialmente, o problema de uma família ou de um indivíduo, quanto à proteção de sua integridade física. O intenso e agitado mercado imobiliário não é dominado pelos operários da construção, esses são contratados pelas construtoras, que são contratadas pelo poder público, que deveria ser o poder responsável por dialogar com os operários para resolver o problema da divisão, redistribuição e ocupação do solo, rural ou urbano. Na maioria dos casos e, sobretudo, como parte de uma postura neo-liberal, o Estado repassa esse poder para o mercado imobiliário, ou seja, o conjunto de empresas de construção e de compra e venda de imóveis, construtoras e imobiliárias, que uma vez, empoderadas pelos órgãos públicos e por leis oficiais, supervalorizam seus direitos e super-desvalorizam os direitos daqueles que são os reais construtores e que no final do processo, serão ainda os consumidores, no caso das chamadas casas populares. A construção de uma casa simples, ou popular, igual aquela em que nasci, no bairro Vila Americana, em Queimados, Baixada Fluminense do Rio de janeiro, que foi elaborada e construída por meu pai, que não era engenheiro nem arquiteto, era um experiente pedreiro e mestre em carpintaria, ele detinha os conhecimentos básicos e necessários para construir uma casa simples. Hoje, pensando sobre a questão social, com todas as suas múltiplas expressões, situada na centralidade do debate e das reflexões sobre o enfrentamento do Serviço Social no campo da formação profissional e do mercado de trabalho do Assistente Social, entendo um pouco mais sobre a "dialética marxista", tanto quanto a teoria Gramsciana do "intelectual orgânico" na luta de classes da sociedade capitalista, onde segundo a análise marxista, o capitalista explora a mão de obra operária e ainda o aliena dos valores resultantes do produto do seu trabalho. Em outras palavras o operário produz, mas não desfruta do valor daquele produto, porque, antes de produzi-lo, o dono já era o capitalista e não o operário, que além de produzir, se confunde com a própria mercadoria que produz e, acaba sendo vendido e comprado como se não fosse mais um ser humano e sim, uma coisa, não mais sujeito e sim, objeto de manipulação de outro sujeito, seu patrão, seu dono. Por mais que não pareça estou falando de "direito autoral", é claro que, estou fundamentando para que seja possível, uma compreensão lógica do assunto. No caso do meu pai, penso que ele teve segurança pra construir sua própria casa, por saber que era dono do terreno e desfrutaria, totalmente do valor daquela obra. Isso me parece lógico, já os pedreiros que são contratados pelas construtoras, para construir em terrenos de outros, só podem vender a mão de obra, sem o direito de reclamar o valor dessa venda e sem nenhum direito sobre a obra construída. Meu pai era pedreiro, fazia casas...eu sou compositor, faço canções. O que há de comum entre essas duas atividades? Uma das afinidades entre as duas é o processo artesanal, as duas partem de um princípio da abstração livre para a uma elaboração concreta, fazer uma casa, nasce da necessidade de se abrigar e/ou abrigar a família. Fazer uma canção, nasce da necessidade de se expressar e/ou comunicar ideias para a coletividade. Nos versos inesquecíveis da composição de Zé Geraldo podemos refletir sobre isso: tá vendo aquela igreja, moço? Eu também trabalhei lá! Tá vendo aquele edifício, moço? Eu também trabalhei, lá! Se cada pedreiro ao ser contratado, pudesse se valer de um artigo, onde ficasse garantido pra ele, um por cento sobre o valor de venda daquela casa ou conjunto de casas que ele está construindo ou participando da construção, certamente, isso causaria uma significativa mudança na forma de se relacionar com o Estado e com o mercado imobiliário. Isso colocaria o pedreiro como investidor nesse mercado e não só como, massa de manobra, peça da engrenagem ou peão de obra. Essa porcentagem poderia ser comparada com o direito conexo, quando o músico participa da gravação de um disco ou da apresentação de um espetáculo, mesmo não sendo o autor daquela obra, tem direito à porcentagens pela participação, independente do cachê ou diária. Essa seria uma maneira de pensarmos um caminho reflexivo de enfrentamento da questão social, analisando as afinidades de classes e as afinidades dos mercados. Aqui, consigo perceber uma proximidade, quase inseparável do mercado musical com o mercado da construção civil, incluindo o mercado imobiliário. Aproveito pra lembrar alguns versos da obra de um compositor contemporâneo, que trata exatamente dessa questão: "a cidade não para, a cidade só cresce, o de cima sobe e o debaixo desce" ( Chico Science em, Da lama ao caos, do caos à lama.)o enriquecimento do capitalista e o empobrecimento do operário. O que esse artigo prevê é uma forma de frearmos, minimamente, essa lógica perversa do capital sobre a classe operária, que tanto alimenta a eterna questão social, como algo sem resolução para os pobres e fator de vergonha para as classes pensantes de um país com pretensões adultas.

terça-feira, 9 de abril de 2013

Dois pesos

Penso estar chamando alguém pelo codinome "comunidade", alguém que seja ou possa ser um tipo de interlocutor imediato, mais que uma pessoa próxima do convívio pessoal. Posso estar imaginando que ao falar "comunidade", contemplo todos os meus interlocutores próximos e distantes, sem precisar citar nomes de uns ou de outros. Enfim, contudo que possa parecer, estou certo de que gosto de usar essa palavra "comunidade" por saber da importância dela em minha vida real, concreta e prática. Não teria alcançado o grau de percepção sobre a subjetividade humana, por exemplo, se não tivesse me submetido à experiência de viver em "comunidade" e, simultaneamente, poder trabalhar minha individualidade. Por perceber que era fruto de uma solidão, que um dia se sentiu só e buscou companhia no meio dos seus pares. Desde então, vivo o drama de ser comunitário e ser individualizado, sempre tentando equilibrar os pesos nos dois pratos da balança. O equilíbrio é o maior desafio, contudo, sei que sou e sou muitos, em meu silêncio e em minha solidão acompanhada das solidões dos meus interlocutores, comuns e solidários na vida comunitária.