sábado, 21 de julho de 2012

Linha tênue

Muitas vezes fui às profundezas de sentimentos fronteiriços. De tanto ir, cheguei a pensar que podia brincar de ir e vir, livremente, sem me ferir e sem interferência de outros. Cheguei a pensar também, que podia não mais voltar...aí, me apaixonei por uma linda e triste canção que diz: " Vou! Vou pra não voltar e onde quer que eu vá, sei que vou sozinho...tão sozinho amor! Nem é bom pensar, que eu não volto mais, desse meu caminho..." Essa é, sem dúvida, uma das canções inesquecíveis no meu repertório pessoal. Assim, como brincava de "Ioiô", aquele enrola, desenrola, sobe e desce, sem preocupações com o tempo, brinquei de ir e vir...levei tão a sério essa brincadeira que um dia, entrei em um terreno baldio, que na verdade, era o quintal de uma casa abandonada, onde havia um poço, com água pela metade, aparentemente, limpa e sem perigo. Ali, sozinho, experimentei meu primeiro momento de confronto psíquico com a sensação de estar no fundo do poço. Ali, sozinho, iniciei-me na arte do mergulho solitário e sem equipamentos adequados. Nunca tinha, se quer, escutado a palavra, "apneia", que só apareceu na minha vida com a morte, por afogamento, do ex-técnico do Flamengo, Cláudio Coutinho. Agora, entendo que essa experiência de mergulhar até o fundo das emoções, não é brincadeira. Após a primeira vez, que mergulhei naquele poço, minha percepção foi extremamente alterada. Havia descoberto um novo portal para exercitar minha liberdade, minha solidão, meus medos, minha intimidade, minha respiração, a relação prazerosa com o som e o silêncio, o direito de submergir/emergir e a consciência de estar livre no fundo e preso na superfície. Foi mais ou menos, nessa fase que escrevi meu primeiro texto, uma tentativa de colocar no papel, os detalhes de algo que se apresentava pra mim, como um acontecimento extraordinário e inesquecível. Esse texto foi baptizado de " Contato Esmeralda". De lá pra cá, tenho colecionado rascunhos de minhas reflexões sobre os desafios de "ser", "estar", "não ser" e "não estar" no mundo. Tudo isso vai sempre estar ligado aquele ritual iniciático dos "mergulhos", que a princípio, era só uma brincadeira, depois se transformou em uma prática reflexiva. Mesmo quando escrevo só pelo exercício da expressão escrita, articulando as palavras, como em um jogo de combinatórios improváveis, sei que estou lúdico...mas, não estou brincando.

Nenhum comentário:

Postar um comentário