sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

Sou assim

Se não fosse como sou, não saberia o que é ser assim. Se não tivesse nascido onde nasci, não saberia o que é nascer ali. Se não tivesse me criado em várias partes do Estado do Rio, não saberia que ser fluminense é muito mais que torcer pro clube carioca. Se não tivesse caído do berço antes dos dois anos, não saberia os significados de uma queda. Se não tivesse me queimado no ferro de passar roupa, não teria descoberto que algo quente demais queima a pele. Se eu não fosse neto de seu Policarpo de Paula, não teria tantas melodias na composição dos meus tecidos neuronais, não teria ficado exposto aos seus momentos de inspiração, no alto do morro São João, abraçado a sua pequena sanfona de oito baixos. Se não fosse filho de D. Mariana Francisca Baptista, não saberia o que era ser mulher negra, pobre e mãe entre as décadas de 50 e 90, na periferia da cidade do Rio de Janeiro. Se não fosse filho de D. Mariana, não teria o privilégio de aprender gungunados, pontos de jongo, maxixes e sambas dentro de casa. Se não tivesse vivido parte da infância em Campos dos Goytacazes, não saberia o que significa ser Boia-fria, agricultor, trabalhador rural e latifundiário. Não entenderia a lógica da reforma agrária. Não teria aprendido a respeitar o tempo da semente que introduzimos na terra, até virar planta, até gerar o fruto-alimento. Se não tivesse vivido tais experiências, não seria quem sou. Sou assim, porque, vivi assim.

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