sábado, 1 de maio de 2010

SOBRE O CONCEITO "JONGO CONTEMPORÂNEO"

Jongo Tradicional & Jongo Contemporâneo
Augusto Bapt
(Banda Caixa Preta)



Jongo Contemporâneo
Conceito artístico-musical, híbrido, inspirado e desenvolvido a partir da relação direta com Mestres Jongueiros de vertentes e posicionamentos diferenciados sobre à prática dessa cultura tão antiga quanto a presença do homem negro em "terras Brasileiras".Por um fenômeno Geo-político, o contingente jongueiro fixou-se e proliferou-se, na região Sudeste do Brasil. Jongo é uma manifestação cultural que consiste em perpetuar uma mística ritualística de preparação do corpo e da mente para o transe ou mudança de estado de consciência, em todos os níveis...psíquico,social e político. A partir da compreensão lógica e simbólica da prática do "Jongo Tradicional", o "Jongo Contemporâneo" desenvolve-se como uma consequência natural e inevitável... pois, trata-se da relação dos novos homens negros interessados em lançar canhões luminosos sobre o conteúdo poético- filosófico
produzido e sufocado durante os séculos de escravidão, seguidos por séculos de indiferença e descaso. Sendo assim, " Jongo Contemporâneo" é a expressão trans-secular do homem negro, herdeiro direto da prática de transitar no espaço-tempo consciente da presença espiritual dos seus antepassados.Em termos musicais, caracteriza-se pela fusão de informações de todas as linhas da musicalidade negra de todos os tempos...Spiritual, Blues, Jazz, Rock, Soul, Funk,Reggae, Samba, entre outras tendências.
Noutros termos, Jongo Contemporâneo pode ser entendido como uma tradução da expansão musical do Jongo Tradicional, tocado com instrumentos modernos como o violão, guitarra, sax, trompete, piano, trombone, violino ou ainda uma batucada de Jongo realizada com instrumentos de Escola de Samba. Após algum tempo,desenvolvendo e aplicando exercícios de improvisação rítmica e melódica,em oficinas para crianças,
adolescentes e adultos, em espaços formais e não formais na cidade do Rio de Janeiro,pude ampliar o diálogo do Jongo com outras matrizes,quero dizer,encontrei condições para experimentar inúmeras possibilidades de composição do módulo básico do Jongo com módulos de outros gêneros musicais. Paralelo ao processo de pesquisa e criação artística,fui construindo uma Plataforma Discursiva,ou seja,quanto mais aprofundava a investigação, mais tinha necessidade de entender e explicar o caminho
percorrido...esse processo me fez e ainda me faz perceber o quanto o Jongo Contemporâneo,entre outras definições,significa :Portal filosófico, para o trânsito e o encontro dos Quilombolas de ontem com os de hoje e com os de amanhã.

Salve o Semba/salve o Jongo
Salve o Samba/salve o Congo
Salve nossos ancestrais!
Salve a África/nossos bantos
Salve a Banda/ nossos santos
Salve nossos Orixás!
Salve os Oceanos/novas travessias
Salve nossos planos/novas poesias
Salve nossa Paz!
salve o povo brasileiro/nossa dor/nossa alegria
salve o Rio de janeiro/montanhas de silício e maresia...
Salve os mananciais!
salve os campos/salve as fontes
Os Rios e os Belorizontes
salve as Minas Gerais!
salve o sol/o som/o sal/os sais
algodão/cana/café/milho e minerais
Salve os partos naturais!
salve a mãe de leite/salve a parteira
as ervas/o azeite/salve a rezadeira...
Salve os novos nascimentos/salve os "meninos do Brasil"
salve o redescobrimento/salve o portal que se abriu
salve o interior/salve o litorâneo
salve o tambor do "Jongo Contemporâneo"!




Nas palavras do mestre Messias, jongueiro carioca,” o Jongo é ritual de preparação de guerreiros”... Em sua fala percebi o quanto era importante para ele enfatizar o aspecto sócio-político desta manifestação. Outro mestre bastante conhecido aqui no
Rio, dizia:” O Jongo não é de buia...”, verso de um jongo muito cantado pelo Mestre Darcy, que completava:"... O Jongo, se praticado de acordo com a orientação correta, os praticantes podem executar feitos surpreendentes."
No entendimento do mestre jongueiro de Ponte Nova, MG, nosso querido Délcio Teobaldo (roteirista - TV Brasil e escritor ganhador do prêmio Barco a Vapor - 2008) o Jongo é tão sério que não deveria ser praticado por qualquer um e, roda de Jongo para ser respeitada precisa da presença de um “Negro Cumba”, aquele que tem o DNA, detém os códigos genéticos e sabe interpretá-los para a comunidade. Baseado nessa argumentação ele afirma:
"Jongo não se ensina!" Por mais, que se aprenda o básico, se você não é de sangue,de berço e bacia, nunca será Cumba, pra saber de Cumbaria.

Délcio Teobaldo nos revela em sua análise Jonguiana, as três vertentes de aplicação do Jongo:
a) Cantos/pontos de fé;
b) De trabalho;
c) De Orgia.

O quarto mestre que faço questão de citar aqui, sem dúvida é o nosso Cumbabá maior, Mestre Umberto Balogun. Esse sempre fez questão de me alertar para as mais variadas fontes que geraram o formato dessa manifestação, assim como vemos hoje.
Vindo do outro lado do Atlântico no corpo e na alma dos africanos capturados pelos colonizadores europeus, segundo um consenso entre esses Mestres, trata-se de uma herança do povo Bantu que consiste em prestar culto aos seus mortos,através de toques,cânticos e movimentos corporais repetitivos, representando as seqüelas deixadas no corpo pelo trabalho diário na Lavoura, principal atividade desse povo, de cultura, dominantemente, campesina, que veio se afortunando de almas desencarnadas nos porões dos Tumbeiros. "Por isso, que não gosto de capitão do mato,por isso que não gosto de patrão"! Por isso, luto e combato, sequelas da escravidão..."
Fragmentos de África construindo identidades e perspectivas na Diáspora. Durante muito tempo tivemos que suportar e conviver com uma ditadura estética eurocêntrica, imposta pela a herança colonial representada pelos herdeiros da Casa Grande. Nessa ditadura,assim como em qualquer outra,algo precisava ser afirmado e empurrado guela abaixo de todos os subalternizados da Colônia. No entanto, já entramos em outra era e como diz o verso da canção cantada pelo (primo)Seu Jorge : " Outro tempo começou pra mim agora..."! Que outro tempo começe todos os dias para todos nós e que aprendamos de uma vez por todas a respeitar nossas pequenas conquistas, respeitando e apoiando o levante de qualquer cidadão subjugado nesse país.É mil vezes melhor, uma nova bandeira hasteada,que um cidadão jogado na calçada! Sou um Cidadão Comum, como qualquer Cidadão...Existem Mil coisas e entre essas coisas...os meninos estão lobotomizados, num sinal de trânsito fechado, brincando de atravessar...chama Maria pra entrar na roda,Maria negra da Caxanga Rosa,deusa da roda,nasceu pra rodar...até o Império das águas brasileiras se tornar um assunto que o povo possa debater...
Amigos e amigas, por enquanto,é isso. Inspirado pelo dia do trabalhador e do trabalho,estou dando uma trabalhada no Manifesto dos Doze anos de Jongo Contemporâneo e aproveito pra convidar geral para o lançamento do novo CD da Banda Caixa Preta ( Jongo Contemporâneo)em Julho.Até daqui a pouco! Sigabéns!

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