sábado, 21 de agosto de 2010

Subjeticidade

Subjeticidade
Augusto Bapt.

“...A vida aqui nessa cidade ainda é muito rudimentar, apesar dos computadores instalados, em cada esquina, em cada bar...(*)
Escrevi esses versos para uma canção, na tentativa de expressar uma certa insatisfação frente às contradições expostas no tecido da cidade do Rio de janeiro. Cidade em que nasci, cresci, vivo e estou convencido de que, quando morrer, não serei enterrado junto com meu corpo em cemitérios que respaldam o domínio da civilização greco-romana sobre meus princípios transmilenares, que constituem minha fé pagã, me orientam e me mantem como sou ou como penso e quero ser. “Um cidadão comum como qualquer cidadão...”, que vive cada partícula de sua cidade, entra e sai dos becos e botecos, sobe e desce morros e ladeiras sem ter que pedir,pagar propina ou ser atingido por um “olhar colonial” de quem quer que seja, nem mesmo da loura no outdoor na propaganda da Du Loren e nem do Cowboy, num comercial de Marlboro ou da família eurocentrada, vendendo Kolinos com sorriso Colgate e, muito menos dos gringos que circulam pela cidade e, autoritariamente, esmolam: “samba um pouquinho, aí!Pra a gente aprender!”
Assim, durmo, sonho, sonâmbulo passeio por entre os obstáculos, habilidosamente, sem me ferir, mesmo sabendo que ao divagar por aí, estou exposto às variáveis da vida. Mas,
O que seria de mim, sem as tais variáveis? Justo eu, que venho atravessando décadas e décadas, entre sonhos bons e pesadelos tenebrosos, transando com noites, fecundando madrugadas, pra perpetuar minha espécie e amanhecer mais vivo ou mais integrado ao ato de ser cúmplice do acontecimento humano, que se espalha por todo o planeta e quanto mais se explica, menos se entende. Minha primeira experiência de sociabilidade ou vivência comunitária, fora de casa, se deu num campo de futebol. Lá, pude observar,
por todos os ângulos, as características dos meus iguais e dos meus diferentes. Comecei
a jogar futebol muito cedo, sete/oito anos já disputava os campeonatos do meu bairro, Villa Americana, Queimados, que naquele tempo era distrito de Nova Iguaçu, agora é Município. Lembro exatamente, como foi minha primeira partida. Lateral direito, minha posição inicial, depois me tornei volante, experimentei outras posições, mas, até hoje, sou apaixonado pela camisa 5 e pelo poder de armar, desarmar e traçar linhas imaginárias, do campo de defesa ao campo de ataque. Enquanto escrevo, sinto a emoção de vestir, pela primeira vez uma camisa da Adidas, um short Silze, não lembro a marca do meião e como não tinha grana pra comprar chuteiras,fiz minha estréia de Kichute. Marquei, lancei, gritei, ralei, suei, sangrei. Ganhamos! 3x1. O futebol me livrou dos ácidos lisérgicos, da maconha, da cocaína e das religiões. Me aproximou à poesia, à filosofia e à política. A condição para a primeira namorada ocupar um lugar no meu coração, era gostar e entender de futebol. Como eu era radical na década de 1970!
Depois de me afogar nas linhas insandescidas do Capital de Karl Marx, conhecer a crítica sagaz de Michel Focaut, viajar nas Náuseas de Sartre, entender os surtos de pagelância de Darcy Ribeiro e cantar Jongo com solo de Mestre Darcy Monteiro (Serrinha), amanheço e corro por entre os esguios e perfumados Eucaliptus de Jardim
Palmares, bairro da minha adolescência. Esses anos regados a delírios e saltos mortais de poetas do rock nacional, preconizando uma atitude política que ainda alcançaria a população, mesmo depois que eles já estivessem mortos: “Brasil, mostra sua cara, quero ver quem paga, pra a gente ficar assim...” e “Que país é esse?” “ polícia para quem precisa, polícia para quem precisa de polícia”. Assim amanheço, passeio pelas ruas da lapa, Glória, dou umas voltas na Praça Paris e Aterro do flamengo, embarco em um Cruzeiro que flutua em nossas ondas, ouço as maritacas, me entorpeço com o forte cheiro da “Dama da noite”, lamento tantos oitis pelo chão... qualquer dia desses, enlouqueço e coloco-os numa salada de frutas como se fossem kiuís, Sapotis ou Morangos do nordeste. Certa manhã, percebi algo diferente no ar, parecia o início de um tempo futuro. Elegi o presidente e concordei com a escolha do ministro da Cultura.
Bom Dia! Amanheci!

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